Em umas longínquas montanhas na Índia vivia um mestre budista em um grande templo. O acesso por qualquer meio de transporte humano era quase impossível. A única forma de chegar nesse templo era através de uma densa selva e uma dura escalada.
Luís Roberto era um jovem empresário, com seus apenas trinta e dois anos já era milionário e estava a frente de um grupo com mais de seis mil funcionários. Tão jovem e com tanto sucesso, não havia muito que Luís não conseguia por pura determinação. Porém, não era feliz.
Já tinha tido muito amores que não deram certo, já tinha tentado quase todas as religiões. Fora do campo profissional, considerava sua vida uma fracasso. Parecia sempre estar buscando alguma coisa, que não sabia o que era. Além de todo o sofrimento emocional, sua saúde já estava em risco devido a anos de negligência de sua parte. A vida corrida de um empresário não deixava tempo para dormir e se alimentar direito.
Foi então que um jovem, vestido com uma bata budista e chinelos, entregou a Luís Roberto um livro. Esse livro, de capa dura, com páginas amarelas e roídas, castigado pelo tempo e por traças, descrevia no primeiro capítulo tudo que o jovem empresário sofria: as insônias frequentes, o medo de se abrir com outras pessoas, a busca pelo espiritual. Aquele livro parecia ter sido escrito para ele.
O segunda capítulo do livro usava jargões budistas que Luís não entendia para explicar a solução de todos aqueles problemas. Luís passou noites e noites acordado tentando entender o capítulo dois. Procurou cada um dos termos na Internet atrás de alguma explicação: não encontrou nada.
Foi atrás de um especialista: foi em vários templos budistas espalhados pelo Brasil, ouviu falar muito sobre o budismo e seus princípios, mas nada sobre o capítulo segundo daquele livro misterioso, ninguém, nem mesmo os mestre budistas, entendiam aqueles termos ou os argumentos. Luís já estava quase desistindo quando sua esperança foi reascendida: um jovem discípulo de um templo em São Paulo lhe disse que aqueles termos pertenciam a uma corrente já quase esquecida do budismo, cujos últimos discípulos se encontravam em um templo de difícil acesso na Índia.
Luís então tomou uma decisão: precisava entender aquilo, com a mesma determinação que usou para chegar ao primeiro milhão, chegaria também à felicidade. Sob o risco de perder todo o sucesso material que tinha alcançado até ali, partiu no dia seguinte para as ditas montanhas: descobriria a solução para suas angústias ou morreria tentando. Encontrou, em nova Déli, dois guias que conheciam a área em torno do templo. Foi avisado por todos que muitos morreram tentando lá chegar, que o caminho era cheio de perigos. O jovem milionário não chegara tão longe para desistir.
Depois de seis dias de caminhada pela selva, finalmente chegaram ao pé da montanha, a partir dali seriam dois dias de escalada (havia um pequeno vale onde poderiam acampar mais ou menos a três quartos do caminho). A escalada foi dura, especialmente para Luís Roberto, que não era um grande esportista. No caminho para cima, os viajantes viam cordas rompidas e marcas de unhas que indicavam os fracassos passados, cada uma dessas evidências de perigo deixavam Luís ainda mais determinado.
Finalmente chegou no templo, não acreditava na beleza daquela construção intocada pelos séculos. Tinha um estilo que nunca tinha visto, mas que lembrava os templos zen japoneses. A cada três metros nas paredes havia uma figura monstruosa revestida a ouro. As paredes, sem nenhum defeito, eram pintadas com preto e dourado. O jardim era incrível, cada milímetro parecia ter sido planejado. Como tinha sido construído era um mistério: quem teria levado todo aquele ouro e tijolos? Foi recebido por dois jovens discípulos que vestiam roupas idênticas às do rapaz que lhe entregou o fatídico livro: Luís sentia a mesma excitação que sentiu ao vender a sua primeira empresa.
Foi levado até o mestre.
Subindo uma escada que não parecia ter fim, dentro de uma pequena construção, atrás de duas estátuas aterrorizantes de leões, estava o mestre. Luís nunca tinha visto alguém tão velho, era difícil determinar a sua idade, devido a penumbra e o fato que o idoso raramente se movia. Mas sua voz entregava o castigo dos anos, disse:
- Eu sei porque tu estás aqui, todos vêm pelo mesmo motivo -- demorou cerca de trinta segundos para terminar essa frase, aparentemente já não falava há dias.
- Então -- respondeu rapidamente o jovem empresário -- me explique, mestre, o capítulo dois.
Até que o mestre respondesse, passaram-se três minutos. Esse tempo pareceu dois anos para Luís, toda aquela espera e dificuldade, que somavam-se aos anos de angústias pessoais, faziam sua mente correr a dez mil quilômetros por hora. Tudo parecia se misturar em seu cérebro, seu coração batia acelerado. Toda aquela adrenalina lhe deixava tonto. Seu coração quase parou quando o mestre começou novamente a falar:
- O homem é o único ser dessa terra que tem a capacidade de alcançar a iluminação. Mas nem todo homem nasce igual. Tu estás acostumado a ter tudo que desejas, mas não te satisfazes. O motivo é que desejas a coisa errada. Não é na riqueza e no poder, nem no amor de mulheres, nem na admiração e inveja de homens, que está a tua satisfação: ela só vai ser alcançada no momento em que descobrires o Sentido da Vida.
- O Sentido da Vida? -- respondeu, incrédulo -- então o mestre sabe o Sentido da Vida?
- Faze o seguinte: vai e encontra a ave azul de patas roxas que fala a língua dos homens, entenderás então o Sentido da Vida.
- Como assim? uma ave azul de patas roxas? o que isso tem a ver com o sentido da vida? é um papagaio? eu não entendo, por favor me explique!
O mestre não disse mas nenhuma palavra. Luís ficou doze horas tentando fazer o mestre explicar melhor o que aquilo significava. Mas o mestre permanecia imóvel, o único movimento que fazia era piscar, apenas uma vez a cada vinte minutos.
Luís saiu de lá desconsolado. Como uma pássaro iria fazê-lo descobrir o Sentido da Vida? Talvez tantos anos em um templo longínquo teriam levado aquele velho à loucura. No entanto Luís Roberto não chegou tão longe para nada, ele não era do tipo que desistia na primeira adversidade. Iria encontrar aquele pássaro ou morrer tentando.
Passou os próximos cinco anos procurando a bendita ave, andou pelos quatro cantos do mundo. Uma pista falsa levava a o outra pista falsa, que levava a um beco sem saída. Buscava cegamente, sem pensar em nada além de seu objetivo. Não perdia um só minuto e não se dava luxo de indulgências. Sua vida era só procurar, procurar, procurar. E enquanto buscava, suas empresas, sem seu comando, foram falindo, uma a uma, até que nada restou de sua fortuna, legado e fama.
Derrotado, Luís Roberto voltou ao templo. Iria implorar ao mestre pela resposta. Se não a conseguisse, se jogaria do alto da montanha, nada mais importava para ele, todos os seus bens e conquistas tinha desaparecido. Enquanto escalava a montanha, desta vez sem a ajude de guias, se sentia estranhamento calmo. Teria se resignado a seu destino? talvez os fracassados sejam livres, livres de responsabilidades, de expectativas. Ainda assim algo lhe roía por dentro: não achara o pássaro, nem o Sentido da vida.
Ao chegar ao topo do templo, não pode nem falar antes de ser interrompido pelo mestre:
- Então jovem que tem tudo que deseja, encontraste o pássaro?
- Não, usei todos os recursos e forças que tinha, mas não encontrei -- dizendo isso, Luís se ajoelhou, e continuou -- por favor mestre, preciso saber, perdi cinco anos da minha vida, só procurei, procurei e procurei. Mas não achei nada.
- Passaste anos procurando o pássaro de penas azuis e patas roxas, se tivesses o encontrado, terias descoberto o sentido da vida. Porém o pássaro não existe.
Nesse momento, Luís Roberto descobriu toda a verdade: o mestre era um pau no cu.