"[...] Nosso corpo e alma não são dois e não são um. Se você acha que seu corpo e mente são dois isso está errado, se você acha que são um, isso também está errado."
De uma certa forma, eu concordo com esse texto. Corpo e alma não podem ser considerados como duas entidades separadas, nem são a mesma entidade. Corpo e alma não podem se separar porque um não existe sem o outro. Quando o corpo desaparece, a mente desaparece. Já a mente simplesmente não desaparece sem que o corpo não tenha desaparecido. Falando assim parece que a mente é um aspecto do corpo, isso também está errado. A mente emerge como estrutura através do comportamento do corpo. Então na verdade a mente não existe no sentido material, mas num sentido estruturalista.
No parágrafo anterior eu dei a minha visão sobre a questão da dualidade. Mesmo que ela esteja errada, qual a diferença entre o meu texto e o do mestre Suzuki Shunryu? A linguagem empregada. Esse tipo de linguagem é frequentemente utilizada em textos budistas ou textos filosóficos orientais. A princípio parece cercado de paradoxos, e é.
O budismo Zen tem como raison d'être o Satori, a iluminação. Para atingir essa iluminação, os estudantes são expostos a diversas histórias e enigmas, chamados Kooans. Essas histórias, minadas de paradoxos e linguagens obscurantista, visam mostrar ao discípulo uma outra visão sobre o mundo, algo que ainda não pode ser expressado por palavras. Como base do Zen budismo, temos a ideia de que precisamos extrapolar a linguagem para entender a Verdade. Ou seja, a premissa é que a linguagem e a lógica são ineficientes para compreender a Realidade.
Ora, é obvio que a linguagem não pode expressar toda a realidade. Os olhos não podem enxergar tudo que existe porque o mundo não foi feito para os olhos, e sim o inverso. Da mesma forma a linguagem e o raciocínio emergiram como estruturas em seres finitos, com necessidades finitas. Isso, no entanto, não significa que a linguagem não possa ser desenvolvida, os seres humanos estão melhorando a linguagem há séculos. Esse tipo de linguagem "experimental" tem o seu papel no desenvolvimento da linguagem.
Porém, outra explicação para o paradoxismo do budismo seria malícia. Envolver um texto em paradoxos tem um uso muito prático: te permite nunca estar errado. Se eu postulo que não é verdade que A ou não A, pela lógica clássica eu estaria errado. A proposição A ou não A é uma tautologia. No entanto, se a ciência de alguma maneira descobre que não A, é muito mais fácil adaptar a tua ideologia para acomodar esse novo fato do que se o teu texto dissesse com todas as letras A. Difícil mas não impossível, vide firmamento.
Usar paradoxos é mais uma maneira de ser vago, poético ou pseudo profundo. É a garantia de que qualquer besteira que tu disseres poderá ser clamada como sabedoria, somente depois que a ciência descobrir, claro.
Então, na tua opinião, o budismo é obscuro porque é budismo ou é budismo porque é obscuro?