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4 de outubro de 2014

A Ana-mariazação da Sociedade


Dizem que Monalisa tinha sobrancelhas e que era séria. Eu a imagino através dos séculos, vendo suas cores desaparecem, suas sobrancelhas sumirem; imagino-a vendo tudo isso e sorrindo. O que fazer? talvez o desaparecimento da beleza também seja belo. 

É o destino da mulher se conscientizar de sua beleza já em seu declínio. A beleza da mulher é um poema escrito na areia. Eu imagino o pavor da, antes bela, mulher que se olha no espelho e vê sua mãe. Aquilo que lhe dá razão de existir agora desaparece em sua frente, sem que nada possa ser feito.

Com sorte o ser humano é o ser do hábito, e dado o longo tempo para se acostumar com o novo estado-das-coisas, a mulher se acostumava com a beleza perdida. Como Monalisa, ela sorria. Mas criamos maquiagens e as revistas femininas: não mais era possível se contentar. A mulher não tinha mais o direito de ficar velha. É a ana-mariazação da sociedade.

Consumismo. Quanto mais passam-se os anos, mais maquiagens, mais Cosmopolitans. Até o momento súbito da cajadada de Cronos. 

Beleza é poder. Ninguém obriga ninguém a usar maquiagem (talvez o dono do circo obrigue o palhaço, mas esse tem o direito de virar trapezista ou limpar a jaula do elefante). Mas não usar significa a perda do poder. Alguns apontam a obrigatoriedade da maquiagem como indício do machismo na sociedade, mas pelo menos a mulher tem a alternativa: tudo que estende a aparência de juventude do homem é ridicularizado.

A tecnologia estende nossas capacidades, podemos pular mais alto, viajar mais rápido e estender a juventude até estágios ana-mariescos. Mas ainda não estendemos nossas emoções para lidar com essas novas capacidades. Estamos fadados ao momento fatídico: olhar-se no espelho e ver Louro José.