Páginas

10 de novembro de 2012

Não existem bengalas


O guia ainda não foi escrito, e nem vai ser: a iniquidade do ímpio é a glória do outro.

Entre duas pessoas existe um abismo infinito. Por isso só ouvimos eco, não há o outro, só vazio. Só nós mesmos. O outro fala, as palavras chegam deformadas: as reconstruímos com nossos próprios verbos e preconceitos. Ninguém te entende? de fato.

Então nos vemos encurralados na Realidade: um abismo infinito em torno de nós mesmos, mas de onde podemos ver os outros. Seus crimes, seus sucessos. Nossos crimes são mais doces, seus crimes, amargos.

Daí vem a tragédia da vida: o abismo é invisível. Falamos baixinho, no ouvido, pensando que somos escutados. Ouvimos palavras doces, as cremos verdade. A verdade afunda no abismo, se perde nas nuances do significado.

Nos vemos rodeados por gente, mas nos sentimos sozinhos, ignorantes do abismo. 

É daí que nasce todo conflito: erros de transmissão.

Mas poderia ser de outra maneira? existe a língua franca sem ruído? sem perda? É a esperança da humanidade, é a suposição tácita da ciência, da religião. É o motivo pelo quão prosperam, e também sua miséria.

Caminhamos como cegos que acham que enxergam. Sofremos as consequências. Uns ainda se acham menos cegos que os outros: escrevem livros, olham de cima. Esses tem a maior queda: substituem ainda mais verbos nas mensagens que recebem. São ainda mais cegos.

Quem sabe do abismo, sabe que é cego. Porém não existem bengalas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário